Marcos Rojo
A facilidade com que as diferentes culturas se interagem hoje em dia, cria situações curiosas, que algumas vezes são engraçadas e outras vezes são preocupantes, mas sempre são surpreendentes.
Nas viagens que fazemos com grupos de brasileiros para a Índia, é comum irmos a algum restaurante, cheios de orgulho por estarmos trajando roupas típicas do local e lá nos depararmos com indianos, também muito orgulhosos por estarem usando roupas ocidentais. Quando isto acontece, nos entre olhamos cheios de pontos de interrogação. Não sei se parecemos ridículos usando aqueles camisões cumpridos que vão até os joelhos e que curiosamente se chamam curta, ou se parecemos simpáticos tentando prestigiar a cultura local. Seja como for, sinto que tanto os indianos, como os brasileiros estão bem abertos para novas experiências.
Tudo fica ainda mais complicado, quando vamos almoçar numa casa de família indiana tradicional e na tentativa de seguir o costume local, resolvemos comer com as mãos, ou melhor, com a mão, porque só se deve usar a mão direita para comer. A comida é muito variada e alguns componentes são ensopados, o que faz com que invariavelmente a comida líquida escorra pelos dedos e desça até o cotovelo. Além da falta de habilidade com a mão, junte o fato de estarmos usando os trajes locais, que são de manga cumprida e não dão muita mobilidade e o resultado é que depois do almoço temos que tomar banho e lavar a roupa.
O meu primeiro choque com a cultura indiana foi em 1979 quando um dos colegas de curso me convidou para participar da cerimônia de casamento dele. Fiquei assustado quando ele me disse que o casamento tinha sido “arranjado”. Ele conhecia a esposa apenas por uma foto de tamanho 3X4 que ele costumava carregar, ou seja, ele conhecia a futura esposa dele tão bem quanto eu, ou melhor, ele não conhecia a noiva. Como um jovem ocidental recém casado, eu achei aquilo muito primitivo, não podia acreditar em tal submissão. Hoje, como pai de quatro filhos, três meninas e um menino, confesso que já não acho esta idéia totalmente absurda.
Os sustos não acontecem só quando estamos lá, tenho trazido professores indianos para os cursos que realizamos aqui no Brasil e tenho percebido que eles também se assustam com coisas que acontecem aqui.
No ano passado tive o prazer de hospedar pela 2a vez o Dr. Nisal na minha casa. Lá pelas 21hs, enquanto jantávamos, minhas filhas, que não são mais crianças, vieram se despedir porque iam passear. Dr. Nisal, admirado com o horário, perguntou se era comum que elas saíssem tão tarde e a que horas elas voltariam. Vendo que ele já estava chocado, menti e disse que elas voltariam lá pela 1 da manhã (normalmente quando voltam às 3 horas, me dou por feliz). Ele quase caiu de costas e perguntou aonde iam. Disse que costumam se reunir num bar, para conversar e dançar. Inconformado, me perguntou se teriam a companhia de meninos e quando eu confirmei, só lhe sobrou a última e a devastadora pergunta: – “Mas, elas fazem sexo?”. Atordoado com a surpreendente curiosidade, só me restou perguntar se ele queria mais sopa.
Não acho que temos que viver como os indianos de antigamente e nem que os indianos devam viver como os ocidentais de hoje. O que me assusta é o fato de muitos acharem que só existe uma forma correta de se pensar e agir e tudo o que estiver fora do padrão, está errado. É preciso sair desta “normose”, como diz o queridíssimo professor Hermógenes e uma das formas é entrar em contato com outras possibilidades e com outras respostas.
Quando trouxe o professor Pratap pela primeira vez ao Brasil, fui leva-lo para passear num dos shopping centers de São Paulo, já que este tipo de conjunto ainda não era comum na Índia. Depois de percorrer todos os corredores e lojas, perguntei a ele o que ele achava de tudo aquilo. E ele me respondeu que nunca tinha visto tanta coisa que ele não precisava. Quase cai de costas, só não perguntei se ele queria mais sopa, porque não estávamos jantando.
Brincadeiras e curiosidades à parte, o que tem me preocupado com este intercâmbio entre oriente e ocidente, é que algumas coisas são perdidas.
Como professor de educação física, vejo com bons olhos o fato da ginástica tornar-se mais consciente. Tenho acompanhado o aparecimento de novos sistemas de trabalho de corpo do tipo “ginástica orgânica”, “eutonia” e a “anti-ginástica”, onde o enfoque é para um trabalho de interação corpo e mente, ou seja: estão “yogalizando” a ginástica. Por outro lado vejo com muita preocupação o fato do yoga estar se “ginasticalizando”, ou seja, tornando-se mecânico, calistênico e com objetivos puramente corporais.
Cuidado alunos, não comprem gato por lebre. Se você quer ginástica, faça ginástica, se quer yoga, faça yoga.