Marcos Rojo
1. Quando a mulher se propõe a iniciar uma atividade física, geralmente ela quer conquistar uma condição física melhor. O desejo de ter um corpo mais bonito já pode ser considerado um início de autoconhecimento físico?
R: Acho que devemos separar três coisas que você citou: “condição física”; “corpo mais bonito” e “autoconhecimento”. 1) Condicionamento físico pode ser uma preocupação com a saúde ou pode ser o desejo de conquistar habilidades extraordinárias. De qualquer forma é voltado para o corpo e não tem muito a ver com autoconhecimento. 2) Ficar mais bonito está relacionado com vaidade, com a necessidade de ser apreciado pelos outros, não deve ser confundido com auto estima e nem deve ser confundido com autoconhecimento. 3) Autoconhecimento é a busca de nossa essência, é querer saber realmente quem somos é a busca dos sábios e dos místicos. Autoconhecimento físico eu imagino que seja o conhecimento de nossas limitações e possibilidades.
As três coisas são importantes, mas não são iguais, não acredito que o desejo por ter um corpo mais bonito possa ser considerado um início de autoconhecimento físico. Corpo mais bonito me dá a impressão apenas de beleza externa. É preciso cuidar da beleza interna, da beleza dos relacionamentos e da beleza emocional. O autoconhecimento está mais relacionado com a beleza interna e também pode ser desenvolvido através do trabalho com o corpo.
2. Durante a prática da corrida essa mulher lida com dificuldades constantes, como acordar cedo, enfrentar frio, dores, cansaço etc. Esses pequenos obstáculos que são vencidos ajudam essa pessoa a se conhecer melhor? De que maneira?
R: Não considero pequenos obstáculos. Acho que são grandes obstáculos e a superação destes obstáculos exige muita disciplina e disciplina é o mais importante quando se pensa no autoconhecimento ou no desejo de se conhecer melhor. Quando temos um objetivo, especialmente se for um objetivo a ser alcançado a longo prazo, nossa determinação acaba sendo nosso melhor aliado.
3. Como essa mulher pode aproveitar o momento em que ela está sozinha, correndo, para se conhecer psicologicamente?
R: É preciso fazer destes momentos onde nos cuidamos, momentos preciosos do dia. Quando você estiver com você mesma, esteja apenas com você e quando estiver com outras pessoas, esqueça-se de você. Ou seja, não faça suas práticas pensando nos outros, se comparando, se rejeitando ou desejando ser melhor do que você é. Pratique para você mesma, para melhorar sua saúde e aliviar o stress. E quando estiver com outras pessoas, dê atenção a elas, ajude-as ouvindo-as e esqueça-se de você mesma.
4. De que maneira a atividade física como um todo pode melhorar a vida dessa mulher do ponto de vista intelectual, afetivo e físico?
R: Quando você está bem com você mesma, os aspectos intelectuais, afetivos e físicos estarão bem resolvidos. Por isso eu insisto que ao fazer a atividade física, pense que você não necessita da aprovação do outro. Passamos a maior parte do nosso tempo tendo que provar alguma coisa para alguém, só que não sabemos o que temos que provar e nem para quem. Quando estiver fazendo seus exercícios, seja qual for a modalidade, faça deste momento um momento para sua evolução física, mental e porque não, espiritual.
5. A corrida pode funcionar como um espelho para essa mulher? Como se fosse um momento onde ela avalia seu nível de persistência, de perseverança e de determinação, por exemplo.
R: Concordo que seja um momento de avaliação de sua persistência e determinação, mas não concordo que seja um espelho. Acho que estes momentos são estratégias, são possibilidades e oportunidades. A idéia de espelho me dá a impressão de alguém que se compara e observa apenas o externo. Acredito que melhor do que se ver é sentir a si mesmo. A pergunta que cada um deve fazer a si mesmo com relação ao auto cuidar-se é: “como você se sente?” e não: “como você se vê?”
6. Muitas corredoras se referem ao momento do treino como “um tempo que eu tiro para mim”. É possível que essa mulher tenha, ao longo do dia, outros momentos como este, onde ela pode se analisar e conversar consigo mesma?
R: Sim. É exatamente isto. Não temos que criar dois mundos ou duas vidas diferentes, uma quando estou fazendo exercícios e outra quando trabalho ou tenho meus afazeres do dia a dia. O estado de controle que eu atinjo quando me exercito, deve ser conseguido em todas as situações. Não tenho que esperar sair de uma reunião tensa para relaxar fazendo atividade física. Tenho que buscar o mesmo estado de prazer e contentamento, mesmo numa condição desfavorável, mas, confesso que para mim não é fácil. Sou um professor de educação física especialista em yoga. Todos os conceitos que são treinados no yoga, eu acredito que podem ser treinados na educação física. É preciso lembrar que no termo educação física o forte é a educação e não o físico. Educação é o objetivo e o físico é a estratégia.