Marcos Rojo
UMA VIA DE MÃO DUPLA
Minha intenção não é fazer um resumo das técnicas de yoga, mas chamar a atenção para o fato de que através do corpo, nós também podemos influenciar a mente, afinal, mente, corpo e alma, estão interligados.
O Hatha Yoga acredita que assim como a mente interfere no corpo, o corpo pode interferir na mente. A mente interfere na postura, no tônus muscular, no tônus dos músculos internos e na respiração.
Quando recebemos uma notícia ruim, imediatamente mudamos nossa feição, nossa postura e nossa respiração. Quando estamos preocupados, nossos músculos ficam contraídos, nossos ombros, cabeça e tronco se projetam para frente como quem está carregando o mundo nas costas, afinal O TÔNUS EMOCIONAL E O TÔNUS MUSUCLAR ANDAM JUNTOS.
A mente interfere no corpo de imediato, ou seja, se levarmos um susto ou se recebermos uma notícia ruim, não só nossos músculos esqueléticos se contraem, nossa postura e nossa respiração se modificam, mas também nosso intestino se desarranja e podemos ter ânsia de vomito.
Hatha Yoga é um sistema de técnicas que se baseia no fato de que o corpo tem a capacidade de influenciar a mente, mas num grau muito mais sutil e lento, portanto, não tão de imediato. As posturas, ou os asanas, são verdadeiros exercícios psicofísicos, são padrões posturais. Isto significa dizer que ao ficar num determinado asana, por um tempo prolongado, em condições de conforto e estabilidade, conseguiremos fazer com que a mente entre em contato com memórias que poderão vir à tona como “bolhas emocionais”. A liberação de determinadas emoções ajudarão o praticante no caminho da meditação. Visto desta forma, asana é um procedimento de purificação.
Mas, as emoções não interferem apenas nos músculos e postura, interferem também nos órgãos internos. Da mesma forma que podemos acionar memórias ou traumas que estão gravados no corpo, também podemos remover perturbações que estão marcadas internamente. Uma vez, numa aula, um aluno me contou que havia engolido “tantos sapos” naquele dia que sua barriga parecia um brejo. Para estas tensões, o hatha yoga propõe um conjunto de práticas que modificam as pressões internas, alongando músculos e estimulando a circulação a ponto de nos deixar com uma agradável sensação de vazio e amplitude. Estas práticas pertencem ao grupo dos bandhas.
Vivemos em contato com o mundo pelos órgãos dos sentidos. Boa parte do que vemos, ouvimos, cheiramos e saboreamos, nos remete a emoções. Algumas pessoas quando sentem cheiro de flor se lembram da natureza, outros talvez se lembrem de velório. Alguns sabores no fazem lembrar da infância, outros podem provocar náuseas. Gostamos de ouvir algumas músicas porque nos lembramos de uma época ou de alguma pessoa. Enfim, boa parte de nossas emoções, tem ou tiveram contato com os órgãos dos sentidos e nem sempre estas “marcas” são boas, muitas vezes guardamos emoções que nos incomodam e nem sabemos disto. Para que a mente entre em contato com estas áreas (olhos, nariz e ouvidos) e para que emoções tenham chance de vir à tona, o Hatha Yoga sugere a prática dos kriyas.
O mecanismo respiratório é, sem dúvida, o mecanismo que está mais intimamente ligado às emoções. Pessoas que estão com raiva, tem sua respiração rápida, com predominância inspiratória e torácica, enquanto que pessoas que estão calmas, tem sua respiração lenta, com predominância abdominal e expiratória. O grupo de técnicas que o Hatha Yoga propõe para que consigamos modificar nosso estado emocional através da respiração, chama-se pranayamas. Esta foi a grande “sacada” dos antigos yogues. Eles descobriram que o mecanismo respiratório tem este duplo comando, tanto pode ser voluntária como automática e é canal de acesso mais direto para as emoções.
Desta forma, o hatha yoga quer interferir onde as emoções interferem. Não para ajustar uma postura, regular o tônus muscular ou fazer com que respiremos melhor, embora tudo isto vá acontecer, mas para criarmos um canal de acesso às emoções como forma de purificação e controle, para que o caminho da meditação fique mais fácil.
A prática de Yoga deve ser sagrada, não só como prática diária, mas como prática de busca do sagrado, o sagrado de cada um de nós. É bom que tenhamos um lugar e um momento especial para a nossa prática de Yoga. É bom que façamos deste momento um verdadeiro ritual. É bom que haja uma pequena preparação, para que a mente e o “coração” estejam juntos com o corpo, observando toda a relação entre eles. Só assim podemos tornar a prática uma prática espiritual.
O fato de termos um momento do dia dedicado ao sagrado, não significa dizer que o resto do dia é profano. Não estou dizendo que a prática espiritual só acontece no local de Yoga ou num templo e que fora deles o que acontece é profano. Às vezes nos esquecemos que o dia a dia é uma boa oportunidade para pormos em prática a espiritualidade.
Praticamos Yoga para nos tornarmos seres humanos mais atentos, mais plenos, mais autênticos e mais felizes. Faça do seu dia um dia sagrado, faça com que seu trabalho seja sagrado, que a refeição seja sagrada, que seus amigos sejam sagrados, e porque não os inimigos também. Faça com que o profano se torne sagrado e com que o sagrado se torne profano. Que não haja distâncias entre a prática e o dia a dia.